domingo, 14 de março de 2010

Mim

Primeiramente fui adestrado à utopia, e nela vivi até tenra idade, não lembro o exato momento da mudança, mas certo dia a realidade me atingiu com a força de um trem e sem orientação ou escolha tive de aprender a me defender e me virar sozinho com meus sentimentos. Era a descoberta do não pergunte mão responda.

Mas ainda assim o triunfo do bom coração era iminente e muitas portas eram deixadas abertas, infelizmente qualquer um podia entrar por elas, qualquer um. Quando estava cheio novamente a realidade fazia o que sabia de melhor, e antes que eu pudesse me preparar o trem já havia deixado a estação...

Teve início a era do fogo. Forjado em alta temperatura para resguardar os mais puros sentimentos, que insistentemente se faziam presentes contrapostos com as palavras da razão, fui lançado ao mundo e sentia que nada havia de me parar. A invencibilidade da adolescência elevada a enésima potência pelo meio-ambiente propício para o florescimento do ego e todas as mazelas advindas do crescimento sem controle, sem orientação.

Mas tal como Aquiles todos somos falhos e possuímos nossas fraquezas. Os bons e velhos sentimentos lá estavam, esperando serem resgatados e trazidos à tona. E assim foi feito. Por um tempo os lobos se mantiveram  a espreita, observando e aprendendo. A inveja só é sentida na sombra, e como eu brilhava...

A simplicidade de ser quem você é assusta os dissimulados e vampiros modernos, eles não conseguem compreender algo que nunca vivenciaram. E o medo é o pior veneno para a alma.

E com a bonança vem o relaxamento e conseqüentemente guardei minhas armas e baixei a guarda. É nessa hora que veio o ataque de onde menos imaginava. A devastação foi total, os danos imensuráveis e as marcas para sempre me acompanharão para lembrar de como o mundo pode ser feio quando visto pelos olhos de quem não sabe enxergar.

Os sentimentos mergulharam em um lago tão profundo quanto a amplitude da minha alma, e lá permaneceram enquanto outros afloravam à superfície em busca de ar. Larguei de lado a armadura e as armas, não precisava mais delas, me ensinaram a força como me defender sozinho. Como não mais me machucar ou sentir algo. E assim foi por muito tempo.

Mas uma corda fora lançada e um novo tempo havia começado. Voltei a ser humano novamente. A sentir e achar que poderia ser o antigo eu novamente. E foi maravilhoso enquanto durou. Mas os danos já haviam sido feitos e era impossível manter o lago congelado e os guerreiros hibernando. De assalto fui tomado e a corda que me suspendia perdeu sua força e novamente afundei no escuro lago de mim mesmo. E com isso vieram as desagradáveis consequências de não conseguir curar as chagas abertas e as coisas que elas me levavam a fazer.

A pancada foi forte. Um leve abalo na superfície mas um maremoto lá no fundo. Que mexeu e tirou tudo do lugar, que eu achava ser definitivo. Mas nada assim o é e nunca será. Sempre haverão mudanças, quer queiramos ou não. Boas ou não somente o tempo dirá.

Mas cá estou eu, sentado à beira do lago, como a muito tempo não fazia. Olhando para o abismo e temendo que ele me olhe de volta e tudo que isso pode significar no momento.

Engraçado como nos deixamos ser apanhados mais de uma vez pelo mesmo tipo de trem, acho que a culpa são dos bons sentimentos que insistem em vir à tona vez ou outra e agir como morfina em nossa percepção. Ou talvez acreditemos mesmo que as pessoas no fundo são boas mesmo quando elas provam que não são.
E como algumas fazem questão de nos lembrar diariamente o quão estúpidas e covardes elas podem ser.

Ao meu lado sentam-se dois caminhos, conheço-os muito bem. Pouca coisa me impede de tomar a decisão de qual devo seguir, na verdade poucas pessoas. Algumas que ainda me fazem ter fé através de seus atos que é possível sobreviver nessa mundo sendo apenas humano. Por essas pessoas ainda não pulei no lago e por outras não me levantei e segui o outro caminho, que não me atrevo a comentar.

De fato,  escolha está feita, o estopim foi aceso e logo toda a carga emocional acumulada explodirá e redefinirá meu universo.

Me levanto, e pela mão levo os dois comigo. Ta na hora de todos nos unirmos e mostrarmos ao mundo quem somos de verdade. Três somos um e um derrubaremos todos. E assim será.

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